O amor é tido como um sentimento tão bonito que naturalmente é pensado como bom, imaculado e que só contribui positivamente para as relações humanas. Os casais e as famílias amam-se, e também o há entre amigos.
É uma ideia romântica, mas, se tivermos em conta que em sequência do amor se criam relações conflituosas e patológicas, talvez seja útil repensar o que realmente significa o amor parental.
O amor é um sentimento que se vive numa relação em que há muita intimidade emocional. Demonstra-se através de atitudes e comportamentos de respeito, carinho, dedicação, etc. Mas estas manifestações são subjetivas, porque cada pessoa tem a sua maneira de o viver: o que é amor para uma pessoa, para outra pode ser sentido como algo desagradável.
Os pais relacionam-se com os filhos com base no que consideram importante transmitir-lhes. Idealmente será uma entrega incondicional, sem interesses secundários. Muitas vezes, mesmo tendo boas intenções, os pais tentam incutir aos filhos princípios que poderiam ter sido importantes no tempo deles e para as circunstâncias que tinham, não necessariamente para os filhos, que são pessoas diferentes numa época diferente.
A sociedade e os costumes evoluem, portanto os jovens de hoje precisam de ensinamentos atualizados, precisam de um amor diferente do que os pais receberam. Se antigamente o amor pelos filhos podia ser demonstrado através de uma educação muito rígida e fundamentada nos bons costumes, atualmente é claro que existem estratégias parentais bastante mais construtivas. O que para os pais pode ser uma demonstração de amor, para os filhos pode ser um ato de incompreensão.
O início de vida dos casais tende a ser financeiramente difícil, principalmente pelo encargo das crianças, o que naturalmente implica que a dinâmica conjugal sofra ajustes consideráveis e que podem durar alguns anos, mas que não se confunda ajustar a vida com desistir dela. Ter amor pelos filhos, querer dar-lhes o melhor possível, é diferente de tornar a vida de casal numa missão focada exclusivamente em trabalhar para garantir-lhes os bens materiais essenciais. Se por um lado pode ser entendido como amor, por outro pode ser sentido como um abandono.
O primeiro dano bilateral surge como uma cruz que é delegada nos filhos, uma dívida que eles não pediram e que, mais cedo ou mais tarde, pode ser tentador deixar-lhes bem claro o sacrifício que foi feito. É o primeiro passo para os pais se sentirem frustrados quando os filhos quiserem desligar-se do ninho, e para que eles se sintam culpados e atrasem essa etapa essencial ao crescimento. Quanto maior for a preocupação de fazer tudo pelos filhos, dar-lhes tudo o que não se teve, maior será a tendência a tornar a relação parental baseada em cuidados práticos.
As principais preocupações deixam de ser a compreensão das crianças e partilhar tempo com elas. Instala-se o medo de que falte alguma coisa, comida, roupa, dinheiro para o futuro e o essencial torna-se trabalhar para que não faltem “coisas” aos filhos. E é assim que começa a faltar a presença dos pais. Os filhos também precisam de pais que sejam um exemplo de como tirar prazer da vida, aprender coisas novas ao longo do tempo, de como conviver com outras pessoas e construir amizades, de mostrar como é que os adultos vivem em casal.
Quando se tenta fazer tudo pelos filhos, pouco se faz com eles!