Todos temos um passado e alguns casos infelizmente com demasiada dor provocada por situações desmerecidas. Nem todos nascem num país com uma sociedade madura, com saúde, numa família estruturada, ou simplesmente têm a sorte de não sofrer acidentes graves ao longo da vida.
A vida não é necessariamente injusta, mas tem muito de aleatória e a liberdade de escolha nem sempre é suficiente para nos proteger desse facto. O psiquiatra Irvin Yalom utiliza a expressão “indiferença cósmica” para caraterizar esta aleatoriedade, o que me parece uma descrição bastante apurada! Felizmente também são poucos os casos em que o balanço é francamente negativo, e a maioria das pessoas tem uma história de vida razoável.
É a experiência de vida que constitui a nossa personalidade e estilo de pensamento, e a forma como utilizamos esse saber para tomar decisões no presente determina o nosso caráter humano.
Podemos utilizar o nosso passado de duas formas: aprender com ele e tomar decisões construtivas, ou prendermo-nos a ele e tomar decisões destrutivas.
As decisões que tomamos são particularmente perigosas se motivadas pela revolta contra o passado. A tendência será descarregar as frustrações do passado nas relações do presente: destrói-se o presente e alimenta-se o sentimento de frustração perante a vida. Com o tempo, está-se condenado a ter um caráter endurecido e pouco disponível para experiências que poderiam preencher a vida com sentimentos positivos.
É um cliché da psicologia, mas tem um fundo de verdade: os momentos dolorosos que se tornam traumas tendem a ocorrer antes de se ser adulto (mas a culpa não é sempre dos pais!). Principalmente porque é uma fase de vida em que se tem pouca autonomia, o sentimento de impotência e fragilidade está muito presente e dependemos de terceiros para nos protegerem. São dois fatores que agravam a dificuldade natural do processo de crescimento. É a dor do processo de crescimento que pode toldar a capacidade de o adulto perceber que é uma pessoa livre com poder de decisão, estando distanciada de uma fase de vida em que se sentiu presa a situações agressivas das quais não se podia defender.
Independentemente das dores do passado lembre-se que tem a possibilidade de aprender com o que viveu para ser melhor, ou de guardar rancor e tornar-se parecida com quem lhe causou sofrimento.
“Aquele que faz de si próprio uma besta, livra -se da dor de ser um homem”. Samuel Johnson